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6 lições do "BBB24" sobre direitos humanos, diversidade e inclusão
Os 10 primeiros dias do programa já falaram de tudo um pouco: machismo, gordofobia, capacitismo, homofobia e racismo...
Marina Dayrell
Há 4 meses
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Em 10 dias, o "BBB24" já nos deu muito pano pra manga. Entre mini tretas, memes e uma superlotação na casa, o programa mostrou, mais uma vez, o seu potencial de ser um reflexo da sociedade. Com isso, temas que aparecem no nosso dia a dia também ganharam um tempinho de tela e renderam bastante discussão.
Reprodução/TV Globo
E é claro que os assuntos de direitos humanos não ficaram de fora.
Por isso, reuni seis situações que aconteceram no "BBB24" e que nos ensinam muito sobre diversidade, equidade e inclusão:
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1) A primeira prova do líder e a falta de equidade:
Logo no primeiro dia de programa já tivemos umas dessas situações. Na primeira prova do líder, que foi de resistência, os participantes precisavam passar por uma piscina de bolinhas e, depois, engatinhar por um túnel com gosma. Nesta parte da prova, duas pessoas competiam entre si pelo melhor tempo.
Mas logo no início da prova, ainda no ao vivo da Globo, foi a vez do atleta paralímpico Vinicius Rodrigues passar pelo circuito. Antes de entrar no túnel de gosma, ele precisou retirar a sua prótese na perna e isso fez com que perdesse bastante tempo. Só depois disso a produção permitiu que ele trocasse a prótese por uma versão que poderia ser molhada na gosma sem correr o risco de danos.
Um dia depois, o apresentador Tadeu Schmidt chamou Vinícius no confessionário para entender como o participante estava e qual havia sido sua percepção sobre a prova. Tadeu conduziu a conversa de forma gentil e atenciosa - mas esse tipo de preocupação precisa vir antes da prova acontecer.
É válido ouvir a percepção do Vinícius, mas não é legal colocar nele a responsabilidade de apontar erros da produção. Para isso, o programa é planejado com antecedência e existem profissionais especializados em acessibilidade que devem ser consultados. A Sarah Aline, participante da edição do ano passado, disse tudo:
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2) Os apelidos capacitistas do Maycon:
Primeiro eliminado da edição, Maycon deixou muita gente revoltada com seus comentários capacitistas (que discriminam pessoas com deficiência) sobre Vinícius. Durante a primeira prova do líder, ele falou várias vezes sobre a perna do atleta paralímpico, inclusive perguntando se poderia batizá-la de "cotinho".
Muita gente achou que Vinícius pareceu não se importar, mas diversas outras pessoas com deficiência se incomodaram, porque, de fato, o que Maycon considerou uma piada, na verdade é uma microagressão.
Não é legal você pegar uma característica de uma pessoa - principalmente essa pessoa sendo de um grupo vulnerável socialmente (o de pessoas com deficiência) - e fazer disso um motivo de risada. Se o que você chama de piada ofende alguém, então ela não é tão engraçada assim.
E lembrando que a pessoa atacada não precisa dizer que se sentiu ofendida: cada um deve cuidar do que fala para não ofender ninguém.
3) Os comentários horríveis sobre o corpo da Yasmin Brunet:
Desde os primeiros dias de programa, o corpo da Yasmin Brunet tem sido alvo de péssimos comentários por parte de alguns participantes, principalmente Rodriguinho e Nizam. A primeira conversa aconteceu no quarto do líder, quando eles começaram a analisar o corpo de Yasmin. Nizam o considerou “estranho”, e Rodriguinho afirmou que ela é bonita, mas que “já foi melhor, está mais velha hoje”.
Minutos depois, eles ainda conversaram sobre a possibilidade de achar uma câmera no chuveiro para vê-la tomar banho.
Ao longo dos dias, a coisa piorou e Rodriguinho começou a falar que Yasmin estava comendo demais e que ela ia “sair rolando” da casa. Ele chegou também a dar um apelido (mais uma microagressão) para ela: Yasmin Comer. Esses comentários foram feitos tanto pelas costas dela, como diretamente para ela.
É um combo de erros que fica até difícil enumerar: objetificação da mulher, achar que a mulher nasceu para se adequar às exigências dos homens, vigilância sobre os corpos das mulheres e sobre o que elas comem, gatilhos que podem provocar transtornos alimentares (Yasmin, inclusive, chegou a dizer que já teve "questões alimentares"), gordofobia (ainda que Yasmin não seja gorda, a menção de que ela ficaria feia ao engordar é um ato gordofóbico) e, ainda, etarismo (a discriminação por idade), ao inferir que, por “estar mais velha”, ela está mais feia.
O corpo de nenhuma mulher deve ser apontado. E isso vale para quem é padrão (branca, loira, magra, malhada, rica e dos cabelos lisos), como a Yasmin, e para todas as outras mulheres que não são. Não adianta achar que essa postura é normal e depois se indignar que o Brasil é o país que mais faz cirurgia plástica no mundo.
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4) O termo racista usado por Luigi:
Nas primeiras horas de programa, em uma conversa com vários participantes, Luigi chamou a Leidy Elin de "macaca". No mesmo momento, ela o repreendeu falando “Não me chama de macaca, não”. Mais tarde, numa conversa apenas entre os dois, ela explicou que, na hora, ficou muito abalada e preferiu esperar a raiva passar para conversar com ele calmamente. Leidy deixou muito claro que não gostou e explicou: “Essa é uma palavra muito pesada, muito usada lá fora para agredir verbalmente a gente que é preto. E você sabe disso, eu não preciso nem te falar. Dois pretos, pobres e favelados, eu e você. Eu não precisava nem sentar com você e falar isso”.
A esposa do Luigi, Hellena Claudia, até comentou o episódio no Instagram, inclusive dando razão para Leidy:
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5) Quando o Luigi ilustrou a importância das ações afirmativas:
Em uma conversa com Deniziane, Matteus e Lucas Henrique, Luigi revelou a dificuldade que ele enfrenta para conseguir trabalhos como dançarino em clipes. Ele chegou a dizer que parou de participar de audições porque percebeu que, muitas vezes, não era escolhido não por falta de habilidades, mas por causa de sua aparência. Essa situação não acontece só com o Luigi e não só no mundo do audiovisual, mas em todo o mercado de trabalho. Por isso que é tão importante termos ações afirmativas que impulsionem as oportunidades e os acessos para pessoas de grupos vulneráveis socioeconomicamente, como as pessoas negras.
6) Quando o Davi disse: "eu sou homem, não sou viado”:
Depois que foi para o seu segundo paredão, Davi entrou em uma discussão com Nizam. Em determinado momento, ele começa a dizer que o seu pai “o fez homem e não viado”. A fala, que também é uma gíria, principalmente na Bahia, é uma expressão homofóbica, porque pressupõe que ser um homem hétero tem mais valor do que ser um homem gay.
Lembrando aqui que ser homem diz respeito a gênero e ser gay é orientação sexual, ou seja, uma coisa não anula a outra: um homem pode ser gay, assim como pode ser hétero, assim como pode ter várias outras orientações sexuais.
Um tempo depois, Davi contou para outros participantes que seu pai o ensinou a vida inteira que ele tinha que ser homem, muitas vezes, inclusive, recorrendo a agressões. Casos como o Davi não são exceção, pelo contrário, eles acontecem aos montes no Brasil, e ajudam a explicar porque a homofobia também é estrutural, ou seja, está nas bases da sociedade.
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A lição que fica aqui foi dada pelos próprios participantes do BBB. Isabelle e Michel chamaram Davi para conversar sobre esse episódio e explicaram para ele que uma fala dessas é homofóbica. Diante dessa conversa, Davi reagiu de uma forma bastante rara de se ver em quem erra e é alertado disso: parou para ouvir, consentiu, disse entender e pediu desculpas.
Essa é a principal lição que podemos tirar dessa situação: se alguém está nos dizendo que algo que fizemos ou falamos é ofensivo, a gente precisa parar para ouvir.