O ator trans BENJAMÍN é o protagonista cis da série "B.A: O Futuro Está Morto": "É importante ser visto pelo trabalho, e não apenas pela identidade de gênero"
Ele também lançou uma música e está buscando espaço e visibilidade.
Ser a primeira pessoa a fazer alguma coisa costuma provocar, ao menos, dois sentimentos: a sensação de responsabilidade, já que, de uma forma ou de outra, você acaba se tornando uma inspiração e trazendo representatividade, e solidão ao perceber que, embora você alcance posições altas e realize sonhos, quando olha para o lado não vê muita gente parecida com você.
Carmen Campos
Aos 24 anos, BENJAMÍN é o primeiro homem trans a interpretar um papel de protagonista em uma série brasileira. Ele é o Ariel em “B.A: O Futuro Está Morto”, da HBO Max, que estreou na plataforma de streaming em outubro.
Em uma entrevista você disse que, aos 16 anos, se identificou com o personagem do filme “Meninos Não Choram”(foto), mas que temeu e negou essa identificação porque sentiu que isso faria com que o seu único destino possível fosse o sofrimento, até porque a maior parte das histórias de pessoas trans e travestis que aparecem nas telas é de sofrimento. A gente sabe, pelos dados, que a realidade de muitas pessoas trans e travestis no Brasil não é fácil, mas você acha que a indústria audiovisual pode ajudar pessoas como você a não terem medo dessa identificação?
Divulgação
"Eu acho que hoje em dia, em 2023, já existem outras formas de se entender mais sobre a transgeneridade, os filmes já estão trazendo isso de alguma forma, mas é claro que ainda tem um caminho imenso pela frente. Existem pessoas que estudam e trazem essa outra forma de olhar para a transgeneridade, que não seja no viés do sofrimento, da doença, da patologia, mas, ao mesmo tempo, a expectativa de vida de pessoas trans e travestis no Brasil é estimada em 35 anos. Então, é uma realidade e é importante dar visibilidade para reverter isso. E eu acredito muito que o audiovisual muda a visão das pessoas, não só no sentido do letramento, mas a arte cria essa oportunidade de você se relacionar mais profundamente com aquilo, por meio da empatia, das emoções e esse é um outro lugar muito potente também."
“B.A. O Futuro está morto” foi a série mais assistida do fim de semana de estreia tanto no Brasil quanto na América do Sul, o que mostra que ela foi bem recebida por uma parte do público, mas você gravou um vídeo dizendo que está recebendo muito hate e muita transfobia. Como tem sido lidar com isso?
Luciana Barreto
"Quanto mais visibilidade, mais a série vai atingir novos públicos e, às vezes, esses públicos não são tão receptivos. É natural que isso aconteça, mas, ao mesmo tempo, me deixa um pouco frustrado. A série como um todo sofreu um hate grande por falar sobre um governo fascista, eu recebi muita transfobia, o que é muito incabível pensando que é crime no Brasil, mas, mesmo assim, rola solto.
As pessoas destilam ódio mesmo e as redes sociais ainda não têm ferramentas para filtrar e combater isso, então eu fico um pouco frustrado. Eu fui aprendendo muito mais a valorizar outros tipos de comentário. Não é como se seu relevasse, porque é um retrato bem grande da nossa sociedade, e eu me preocupo com o país em que a gente vive e com a qualidade de vida das pessoas trans, mas eu aprendi a valorizar muito mais outros tipos de comentários."